A crise no sistema de saúde em Rondônia, em função da pandemia da Covid-19, foi mais uma vez tema de uma audiência na 2ª Vara de Fazenda Pública em Porto Velho. A audiência é resultado de uma Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público do Estado em desfavor do Estado de Rondônia e do Município de Porto Velho, a fim de garantir medidas de isolamento mais radicais com a suspensão do Decreto Estadual n° 28.859/2021, e a retomada do Decreto n. 25.853/2021, cujo teor é mais rígido e restritivo, em razão da Covid-19.
Por conta do interesse público envolvendo a discussão, a audiência foi transmitida ao vivo pelo canal do TJRO no YouTube, chegando a registrar mais de mais de 8 mil visualizações em momentos de pico, mantendo-se numa faixa de 400 visualizações. Com a participação de autoridades e representantes de entidades ligadas ao comércio, a audiência terminou com a manutenção do decreto vigente, porém com a determinação de enrijecimento da fiscalização para seu fiel cumprimento.
Em sua fala, o governador do Estado, Marcos Rocha, justificou o atual decreto como medida que busca o consenso. “A gente vem trabalhando no sentido de ir agregando a segurança, como também a possibilidade de a população trabalhar. O governo necessita do apoio das prefeituras, que estejam juntas trabalhando para fazer a imunização. O que precisamos é convencer a população de que não é momento para aglomeração”, disse.
Trazendo um cenário da pandemia no Estado, a médica Tatiane Oto, chefe da Central de Regulação de Vagas do Estado, apresentou o cenário preocupante do déficit de leitos para atender pacientes com Covid-19. Segundo o último boletim, de quinta-feira, 152 pessoas estavam na fila aguardando vaga, sendo 115 em estado grave, e o restante moderado. “No início da pandemia não havia paciente em estado moderado, todos estavam conseguindo atendimento. Hoje temos colapso até na fila de enfermaria, que partem na maioria nas UPAs. Temos melhorado nossos processos de regulação, mas todas essas ações têm sido insuficientes para atender todos esses pedidos”, esclareceu.
Emília Oye, promotora de Justiça na área da saúde, ao argumentar sobre a ação, disse que a instituição sempre manteve o diálogo com o setor produtivo, mas que a gravidade da situação exige medidas mais restritivas. “Todo dia a gente recebe informação de que não há mais leitos, pacientes em cadeiras, UPAs lotadas. O Samu não consegue encontrar mais leitos, os pacientes estão ficando dentro da ambulância. O que o MP pede nesta ação é que seja considerada a necessidade de prolongar e enrijecer esse distanciamento, porque não temos mais condição de vislumbrar a abertura de mais leitos”, alegou.
Outra promotora de justiça, Flávia Shimizu Mazzini, que teve sua fala marcada por manifestações de empresários, que produziram um protesto em frente à sede do Ministério Público em Porto Velho, buscou justificar a necessidade de adoção de medidas mais rígidas. “O cerne da questão nem de longe é apontar culpados, onde há contaminação ou não, quem está cumprindo as regras sanitárias ou não. Aqui buscamos diminuir a movimentação na cidade, o contato de pessoas e circulação. Dessa forma conseguimos, inclusive, diminuir outros agravamentos de saúde como crimes e acidentes de trânsito, que são responsáveis por grande parte dos atendimentos de urgência”, disse.
O secretário de Saúde do Estado, Fernando Máximo, acompanhado de equipe da pasta, explicou sobre o funcionamento de um Comitê de Assessoria Técnica, composto pela Controladoria-Geral do Estado; Agevisa; Secretaria de Finanças; Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão; Casa Civil; e Secretaria de Saúde, que faz orientações de como está a situação da pandemia, curva de óbitos, que faz essa análise global e passa o cenário. O comitê não tem um poder decisório. De acordo com o secretário, houve a criação de mais de 352 leitos de UTI durante a pandemia, e 600 leitos clínicos. Máximo também destacou a realização de um drive trhu de testagem de Covid-19, em Porto Velho, nesta sexta-feira. Compras de testes, contratação de mais profissionais para atendimento, aquisição de medicamentos e insumos foram algumas das ações do Estado para fazer frente à pandemia.
Máximo foi questionado pelo juízo se a Secretaria participa da construção do critério para a elaboração do decreto que está em vigor e respondeu que o comitê apenas fornece os dados epidemiológicos sobre o atual cenário e que a definição sobre a classificação compete a outro comitê formado por equipe técnica. Ao ser convidado para dar explicações técnicas, o estatístico Caio Nemeth apresentou dados, com base em estratégia, que alimentam as tomadas de decisão sobre as classificações. Segundo ele, o decreto trabalha em cima da movimentação de pessoas, emissão de notas fiscais, dentre outras variantes, que, de acordo com a avaliação da equipe, não comprovam uma relação direta de decretos mais rígidos com redução de contaminação.
Porto Velho
Apesar de tratar da pandemia em todo o Estado, as discussões se concentraram principalmente em Porto Velho, município com maior demanda por leitos. A secretária adjunta de Saúde da Capital informou que o Call Center tem recebido diariamente cerca de 1.300 ligações. Destas, por volta de 800 são encaminhadas para atendimento. “Estamos tentando fazer a população se conscientizar, mas hoje estamos enxugando gelo. Independentemente de posição social, não há leito”. A secretária Eliane Pasini também alertou sobre a gravidade da situação. “Temos trabalhado ampliando todo dia mais um pouco. Ano passado chegamos a 71 leitos, e hoje estamos com 89 e 40 cadeiras nas nossas UPAs. Não tem mais espaço”, alertou.
O prefeito de Porto Velho, Hildon Chaves, usou o espaço para falar principalmente sobre o andamento das tratativas do município para a compra de vacinas. Segundo Chaves, um aporte de 20 milhões de reais foi feito para aquisição dos imunizantes produzidos pelo laboratório AstraZeneca, em parceria com a Universidade de Oxford. A negociação, seria para comprar 400 mil doses. “Estamos acompanhando e tomando todas as cautelas. O que depende da prefeitura, já foi feito. Ontem já recebemos o aceite e isso vai consumir de 25 a 30 dias”, anunciou.
Impacto na economia
Representando o setor econômico e o movimento Pensar Rondônia, que reúne entidades do comércio, o empresário Francisco Holanda defendeu que o fechamento dos comércios prejudica toda a sociedade, com reflexo no aumento de demissões, violência e uma situação social pior. “A grande preocupação hoje é levarmos a informação de maneira republicana, para buscar uma saída honrosa para esses empresários”, disse, propondo uma campanha a ser desenvolvida pelo comércio para sensibilizar a população sobre a necessidade de isolamento.
Representando a Federação do Comércio, o advogado Rochilmer Filho, defendeu ações mais concretas no enfrentamento que contemplem o comércio. “Eu recebi relatórios que apontam que 10 mil empresas fecharam as portas. 83% das famílias perderam renda. Esse é um contexto muito sensível e não tenho dúvida que o trabalho que o Estado de Rondônia vem fazendo converge exatamente no sentido de buscar o equilíbrio permanente”, disse.
Outros setores da economia também manifestaram a preocupação com os impactos, como shopping center, que, por meio de representante, defendeu as medidas adotadas pelo setor para evitar o contágio, passíveis de fiscalização.
O setor educacional também pediu intervenção defendendo a prevenção. O decreto estadual que está em vigor restringe o acesso às escolas, abrindo exceção para os filhos de trabalhadores de áreas essenciais.
Resultado
Após as manifestações e questionamentos, o juiz Edenir da Rosa decidiu pela validação do atual decreto, que permite, ainda que de maneira restrita, o funcionamento do comércio, sob o argumento de que a definição prévia, com base em dados, pelo menos por ora, não permite que o juízo desqualifique um decreto ou outro. “Essa figura da aceitação ou resiliência da população aos decretos foi sinalizada nas curvas de ascendência aqui apresentadas. Seja sob um decreto seja por outro, depende dessas duas medidas. Todos esses elementos me vêm nesse momento para dizer que a medida que entendo ser cabível é determinar ao Município e ao Estado para adotar medidas mais ampliadas de fiscalização”, declarou. O MP requereu que em um prazo de 14 dias, contados a partir do dia 8, quando entrou em vigência, sejam apresentados dados que avaliem a eficácia das medidas vigentes, o que foi aceito. Uma nova audiência ficou marcada para o próximo dia 23.
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Assessoria de Comunicação Institucional